Ágape, Eros & Philia

26/07/2018

"Ainda que eu falasse a língua dos homens e falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria."

 Falar de amor é e foi uma das grandes dificuldades de toda a humanidade. De Platão à Bauman, filósofos e religiosos tentam expressar em palavras o que esse sentimento significa para nós, seres sensíveis. A divisão do amor na tríade Ágape, Eros e Philia é uma das famosas explicações sobre esse tema tão misterioso.

 Desde a Mitologia grega a figura do amor já se fazia presente. Como parte da natureza o amor era um deus. Os olhares superficiais diriam que se trata de Afrodite, no entanto, a representação do amor se refere à outro deus, Eros. Eros teve duas versões de sua aparição. Na Teogonia, Hesíodo afirma que Eros é filho do deus primeiro, Caos. Sendo assim, um deus primordial. A segunda versão relata que Eros seria filho de Afrodite e Ares.

 É curiosa a segunda versão na qual coloca o amor como filho da dualidade, da beleza e da guerra, da harmonia e do caos representado por seus pais. Eros é, então, o deus do amor, do puro amor. Representado pelo atual cupido, a criança alada corria e adorava brincar com seu arco e flecha. Eros é representado por uma criança justamente por sua inocência. Ele sabe que pode atingir as pessoas com suas flechas, mas, assim como o amor, não sabe que pode feri-las. 

 

No entanto, Eros nunca crescia. Sua forma de criança permanecera por muitos anos. Preocupada, Afrodite procurou ajuda com a deusa da Prudência. Ela lhe disse que Eros não poderia crescer sozinho, teria que ter companhia para crescer junto à outro. Esta é, no fundo, uma grande metáfora sobre o amor recíproco, no qual uma pessoa não pode amar sozinha.

 Com isso, Afrodite deu à Eros um irmão: Anteros. Este era totalmente seu oposto, sua adversidade do mundo divino. O que Eros une, Anteros separa. Mas mesmo assim, Eros cresceu e seguiu sua missão, fazendo com que suas flechadas apaixonassem os seres e seus amados.

 Porém, estas representações de Eros fazem parte dos mitos gregos. Platão, em seu diálogo O Banquete relata uma reunião de amigos que se juntam para falar sobre o tão divergente tema: o amor. Entre eles podemos encontrar Fedro, Pausânias, o médico Eriximaco, o comediante Aristófanes, o anfitrião Agatão, Sócrates e Alcibíades. A reunião se divide em discursos sobre Eros, cada um falando seguido do outro. Fedro começa afirmando que Eros é o mais velho dos deuses, fazendo referência ao filho do Caos, já explicado acima. Pausânias reafirma que Eros é um deus, no entanto, divide-o em dois: eros urânio (celeste) e eros pândenio (popular), sendo essa uma divisão do amor divino e do corpo, respectivamente. Eriximaco trata de Eros com o olhar da medicina, sendo algo que se pode aplicar e retirar das pessoas. Em sua vez, Aristófanes conta o mito do andrógino (história para o próximo texto), mas por ora, resumo que este se refere à Eros como as metades de uma totalidade. Em seguida, Agatão discursa em nome de Eros como o deus mais jovem e belo, detentor de toda a pureza.

É nesta hora que entra o monólogo ápice do diálogo. Como sua fama da contradição o entrega, Sócrates começa revertendo e questionando o fato de todos terem se referido à Eros como um deus. Este é um ponto curioso, antes de desconstruir os argumentos de seus amigos, Sócrates faz questão de lembrar que nada sabe sobre o amor. Tudo que dirá a seguir foram palavras de uma sábia que o ensinou. E por de trás do grande pai da filosofia, aqui encontramos Diotima de Mantineia.

Os ensimanentos de Diotima podem ser divididos em dois grandes mistérios. O primeiro refere-se à Eros não como um deus, mas como um daimon. Sendo assim, Sócrates refuta Agatão com o seguinte silogismo:
    1. Eros é desejo
    2. Só se deseja o que falta
    3. Só se deseja o bom e belo
    4. O que falta é bom e belo
    5. Todos os deuses são belos e bons
    6. Eros não é um deus

 Ninguém, no entanto, discordaria que um deus não é bom e belo. Sendo assim, Eros é um daimon. Uma figura que transcende entre a dualidade platônica: o mundo sensível e o mundo inteligível, das ideias. Para Platão o mundo em que vivemos é apenas o mundo do devir, onde tudo que existe são copias e representações imperfeitas das ideas verdadeiras, unas e perfeitas. A verdade esta, então, no mundo das ideas. E é só através de Eros que podemos conhecer a verdade. "É só o amor! É só o amor que conhece o que é verdade."

 Diotima também conta uma outra versão até então desconhecida de Eros na mitologia. Esta refere-se à Eros como filho de Poros e Pênia, deus da abundância e deusa da necessidade, respectivamente. Este mito conta que Pênia no final de uma festa morta de fome se aproximou e abusou de Poros. Da união dos dois nasceu Eros, deus do amor rico e necessitado, do amor que tem os recursos mas que é pobre. Podemos, no entanto, relacionar esta dualidade de Eros filho de Poros e Pênia à Eros filho de Afrodite e Ares.

 No segundo grande mistério Diotima ensina a educação do Eros e o caminho para a transcendência da verdade da forma bela e perfeita. Sendo da seguinte forma:

    1. o amante ama um corpo belo
    2. passa a amar todos os corpos belos
    3. transcende à amar as almas belas
    4. começa a conhecer as virtudes, atitudes e leis
    5. passa a amar a ciência
    6. passa a amar a ciência do belo
    7. e por fim, ama a mais pura forma do belo

 O Eros platônico é, por fim, a tentativa de unir aquilo que se encontra separado. É a falta, o desejo eterno da posse do bom/belo. O amor platônico, um tanto distorcido nos dias atuais, é egoísta, é a ausência da completude.

 Contudo, Eros no mais amplo conceito da filosofia é o amor erótico e corporal.  Se refere à atração física e ao desejo dos prazeres da carne. É o amor associado aos orgãos genitais.

 Philia do grego vem a ser traduzido por "amizade". Este é o amor desprovido da presença de Eros. É o tipo de amor relacionado ao companheirismo de irmão e amigo. Pode ser associado também ao amor pela sabedoria.

 Por fim, o Ágape. Este é um amor bem conhecido pelos cristãos. É o amor espiritual, de grau evolutivo, puramente bom por ser. Associado às ideias, ao autoconhecimento e aos sentimentos. É o amor que transcende o físico do mundo natural.

 Juntos e equilibrados esta seria a tríade primordial para a felicidade humana na terra. E ainda que eu falasse a língua dos homens e falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria.


 

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